Search
Close this search box.

Sermão em 1 Timóteo 1.5-7 Parte II – João Calvino

Vimos esta manhã como devemos lucrar com a lei de Deus e por que ela nos foi dada, a saber, para que possamos ser fundamentados na graça de Deus para esperar a salvação de suas mãos, e para que caminhemos em sua presença com tal abertura e retidão, para que os homens possam saber que realmente fomos ensinados em sua escola, e então que nos comportamos com nosso próximo, sem engano, malícia ou indignação, e que todos nós nos esforçamos para ajudar aqueles que convivemos. Em suma, sabemos que Deus nos tomou como seus filhos, para que tivéssemos entre nós uma justa fraternidade. E São Paulo, tendo estabelecido a essência da lei, acrescenta agora que muitos se afastaram (destas coisas) e se dedicaram a conversas vãs. Ele usa aqui um exemplo tirado do tiro com arco, onde há um alvo para atirar. Os arqueiros não atiram aleatoriamente. Eles apontam para o alvo. Então São Paulo nos mostra que quando Deus nos deu a sua lei, ele pretendia dar-nos um caminho para evitar o perigo de nos desviarmos do caminho certo, vagando sem rumo. E, de fato, não foi sem motivo que Moisés propôs desta forma: “Eis o caminho, anda por ele.”; como se dissesse que os homens não sabem o caminho, nem mesmo onde estão, até que Deus lhes mostre a sua vontade, só então eles têm uma regra que nunca os enganará. Lembremo-nos de que Deus nos dirige desta forma para que não nos afastemos dele, se o tomarmos como nosso guia, o que ele está pronto a fazer, desde que não rejeitemos a sua graça.

E é isso que São Paulo quis dizer com este exemplo. Como também é dito, que todos aqueles que não têm o objetivo de descansar na graça de Deus, a fim de que possam reivindicá-lo como seu Pai, e possam esperar por sua salvação em suas mãos, e não andem com uma boa consciência e um coração puro para com o próximo, são como andarilhos e homens que se desviam. E o que acontece com aqueles que são tão errantes e fazem uma demonstração hipócrita de polidez? Não há nada além de vaidade, diz São Paulo. Ele usa uma palavra neste lugar que significa que não há fundamento para o que eles dizem, não há substância, não há nada além de vento. Na verdade, haverá alguma semelhança, mas é como um balão, ou uma coisa inflada, mas que núcleo existe e que substância possui? Nem um pouco; a ponta de um alfinete vai espetá-lo e deixar sair o ar, deixando apenas uma pele murcha. Então São Paulo compara todas essas especulações justas, que esses bravos companheiros que parecem ser alguma coisa, e querem ser considerados assim, mas não edificam de forma alguma a igreja de Deus. Ele diz que não há nada em sua conversa senão mera vaidade. E aqui temos que aprender uma lição dupla: primeiro, que somos mais perversos quando corremos aleatoriamente de um lado para outro sem um objetivo real, mesmo quando Deus é tão bom a ponto de nos oferecer orientação. Na verdade, os homens se cobrirão com uma pretensão de ignorância quando fizerem algo errado. Contudo, como já mostramos, se nos contentarmos em ser ensinados por Deus, submetendo-nos humildemente à doutrina da lei, encontraremos um caminho mais seguro, e ele estenderá a mão para nós, para que não possamos ir mal. Mas devemos visar a meta que ele aqui coloca diante de nós. E além disso, devemos estar bem resolvidos neste ponto que São Paulo também acrescenta: vencemos uma grande partida e fizemos um ato nobre ao nos fazermos parecer algo diante dos homens. Pois todo o conhecimento que pudermos obter será apenas fumaça e vento se não tivermos como objetivo servir a Deus com uma consciência pura, colocando a confiança da nossa salvação na sua mera bondade, e nos esforçando também para ajudar e auxiliar os nossos vizinhos. Mas isso é bem diferente da mente carnal dos homens. Pois cobiçamos coisas agradáveis, e se os homens acreditassem em nós, sempre teríamos novas perguntas feitas – perguntas inúteis e vãs para nos elevar no ar.

Se um homem nos fala da graça de Deus, se um homem nos mostra que devemos ser pacientes na adversidade, se um homem nos atrai para esta herança do reino dos céus, oh, são assuntos que ouvimos tanto, disso ficamos com raiva, então três palavras são suficientes e estamos satisfeitos. Assim é, no entanto, que o Espírito Santo não se pronunciou sem causa, que assim que um homem se desvia deste objetivo, ele só pode errar, e errar na vaidade e na loucura.

Em segundo lugar, observe que quando não procuramos ser edificados na fé e na caridade, não haverá nada além de leves especulações para nos levar ao alto. Mas, na verdade, não haverá fundamento nem substância. E por isso se pode perceber o que é a teologia católica. Para aqueles que querem ser considerados estudiosos, nada mais estudam do que questões vãs que não produzem doutrina alguma. Quando um homem trabalhou arduamente para se tornar um ministro (um “Divino”, como dizem), ele não será apenas um bezerro gago, mas muito burro, se tiver que escrever pelo menos um sermão. E por que isso? Porque é algo totalmente diferente que eles estudam. Pois eles têm entre eles algo que cheira a feiticeiros e conjurações desconhecidas que são inúteis. Vemos então como essas criaturas miseráveis e vis são envenenadas por Satanás. Com isso eles perverteram todas as religiões, de modo que semearam sonhos como cada homem achava melhor. E por que isso? Porque a palavra de Deus é algo muito vil e comum para esses estudiosos especulativos.

No entanto, isto deve representar um decreto firme e nunca ser revogado. Qualquer homem que não tenha esse objetivo de ser edificado na fé e na caridade, vagueia e se desvia, e tudo o que faz é vaidade. Então São Paulo acrescenta: “Eles querem ser estudiosos da lei, mas não entendem nada do que falam, nem do que afirmam”. Quando ele diz que esses homens querem ser estudiosos, mas não entendem nada do que falam, ele mostra que há duas coisas contrárias neles. Pois se tivessem usado seus estudos para lucrar bem com a lei de Deus, teriam tanta certeza que aqueles que foram ensinados por eles não poderiam ter duvidado. Aquele que lucrou bem na escola de Deus não perderá o controle de sua imaginação para inventar qualquer coisa nova. Em vez disso, ele terá simplicidade, apegando-se àquilo que Deus mostrou a todos nós. Eis então como todos os que são corretamente instruídos na lei de Deus terão certo conhecimento; mas aqueles que não entendem nada do que falam mostram bem que criaram para si mesmos sonhos vãos e querem misturar suas próprias invenções com a verdade de Deus. Isto equivale a trazer uma corrupção que reduz tudo a nada. E por que isso? Deus falou sobre isso? Encontramos algo a respeito disso nas Sagradas Escrituras? É suficiente para nós; todas as questões chegam ao fim quando estamos fundamentados na verdade de Deus. Mesmo que todo o mundo se levante contra nós, ainda devemos continuar com uma constância invencível. Pois sabemos, diz São Paulo em outra passagem, em quem acreditamos. (2 Tim. 1:12) Pois assim que duvidamos da palavra de Deus, não podemos deixar de ficar abalados e incapazes de saber o que Deus quer dizer. E que discrição e sabedoria pode haver no homem quando ele não consegue submeter-se a Deus, e se endurece tanto, para fazer com que seja tomado como bom aquilo com que ele sonhou, veja que Deus reservou esta autoridade para si mesmo, para ser nosso único Mestre? Se os homens assumem a responsabilidade de misturar suas fantasias com os decretos de Deus, poderá ser de outra forma que eles fiquem vacilando em dúvidas? Contudo, como nunca falta ousadia a tais homens, acrescenta que não sabem o que afirmam. Isto sugere muito. Pois se São Paulo quisesse falar aqui de um argumento simples, teria sido suficiente dizer: “Eles não sabem do que falam”. Mas, em vez disso, ele usa uma palavra que carrega consigo mais significado: Eis que esses homens estão decididos, eles não fazem nada além de determinar, concluir e pronunciar, e querem que todo o mundo seja obrigado a acreditar neles. Tal imprudência é sempre encontrada naqueles que não têm base na palavra de Deus. Pois aqueles que sabem que não há mestre senão Jesus Cristo terão esta modéstia: não se colocarão além da medida da sua fé.

Na verdade, quando soubermos o que Deus disse, não balançaremos como juncos. Teremos uma fé que não pode ser abalada e que vencerá todas as tentações. Para ser breve, a fé e as opiniões dos homens não podem concordar umas com as outras mais do que a luz e as trevas. Pois a fé inspira uma certeza. No entanto, como eu disse, os fiéis sempre olharão para o que lhes foi dado, não se apressando em acreditar em algo novo. Terão, de fato, esta prontidão que São Paulo elogia, dizendo: “Desde o dia em que ouvistes, acreditastes”. Assim também estarão prontos para seguir o que lhes for mostrado em nome de Deus, mas não sem discrição, como ele diz em outro lugar. (Efé. 5:17) Por quê? Porque sabemos que não há ninguém, exceto Deus, que deve nos guiar e governar nossas almas. E se os homens vêm até nós e não os discernimos, somos como feras brutais, deixando-nos guiar pelo nariz. Isso não é misturar o céu e a terra? Pois todas as criaturas devem manter o silêncio e somente Deus deve falar. Para que possamos acreditar, isso deve vir dele; devemos estar bem seguros desse ponto. Portanto, no que diz respeito aos fiéis: eles terão (como eu disse) esta modéstia, que não afirmarão nada além do que sabem ser de Deus. Preferem permanecer um pouco em dúvida do que falar sobre algo sobre o qual não foram devidamente instruídos. No entanto, há muitos outros que iriam em frente e fariam isso para não parecerem desaprendidos em alguma área. Essas pessoas querem ser vistas como grandes em conhecimento bíblico, mas na verdade não sabem nada. Mas os fiéis não agirão de forma tão precipitada. Mas os outros que se apresentam e se atrevem a dizer o que acham certo, misturando a imaginação e as fantasias com a palavra de Deus, têm sempre a certeza de que o que dizem é correto e deve ser acreditado e praticado por todos. Por esta razão, São Paulo diz que tais homens, embora pretendam ter certeza, na verdade não podem ter certeza de nada. Eles estão sempre se exaltando e o diabo os leva com tanto atrevimento e ousadia para exigir que suas afirmações sejam tomadas como verdade absoluta. Tudo isso é apenas loucura e frenesi que surge da falta de bom senso para eles pensarem que é suficiente dizerem que seus ensinamentos estão corretos porque Deus lhes disse isso.

Temos boas evidências disso em nossos dias, assim como havia na época de Paulo, como ele diz no segundo capítulo aos Colossenses. Ali ele exorta os fiéis a se manterem na pura simplicidade do Evangelho para que não sejam enganados por esses enganadores, esses estudiosos especulativos, fingindo ser humildes, diz ele, e alegando ter revelações de anjos e outras coisas semelhantes. Durante esse tempo, o diabo foi capaz de espalhar superstições usando as mentes dos excessivamente curiosos. São Paulo diz ali que os fiéis devem ter cuidado para não se deixarem levar. Depois acrescenta que esses outros se envaidecem com o seu próprio entendimento, confiam em si mesmos e se colocam à frente, alegando saber coisas que na verdade não sabem. Assim, vemos que não é apenas em nossa época que o diabo incita os desordeiros a semearem suas más sementes, afirmando com ousadia coisas que eles realmente não conhecem ou entendem. Mas nos dias atuais vemos isso sendo praticado mais do que nunca. De quais ensinamentos os católicos estão mais certos? Mesmo negar a ressurreição dos mortos ou a vida eterna não é considerado por eles uma heresia tão grande quanto negar o purgatório. No entanto, que certeza eles têm do purgatório? Que anjo, ou que demônio, lhes revelou que existe um purgatório? Eles construíram isso em seus próprios cérebros. E embora tentassem reivindicar algum testemunho das Escrituras, em última análise, só puderam descansar na afirmação de que se trata de um ensinamento da antiguidade, de que sempre se acreditou nele. E esta é a base da fé de acordo com os católicos.

Outro exemplo é a sua crença de que os santos que partiram devem ser chamados como defensores e patronos. Ir para Deus, e não ter como guia algum São Miguel, ou a virgem Maria, ou algum outro santo que o Papa colocou no calendário a seu bel-prazer – oh, que isso seja rejeitado, é uma coisa que não deveria ser ouvida para eles. Por que eles ensinam isso? Que razão eles têm? Existe uma palavra ou sílaba encontrada nas Sagradas Escrituras que mostra que os mortos fazem intercessão por nós? É claro que neste mundo devemos orar uns pelos outros, somos ordenados a fazê-lo, e isso beneficia ambas as partes. Mas quanto aos mortos, não há uma palavra sobre eles. Não devemos duvidar disso de forma alguma. No que diz respeito a todas estas devoções tolas que foram introduzidas pelos católicos, todas estas coisas inúteis, não há uma palavra sobre elas nas Sagradas Escrituras. Então de onde eles vêm? São especulações, são sutilezas dos nossos mestres, os homens da Universidade. No entanto, espera-se que as consideremos como verdades estabelecidas e que nem sequer movamos um lábio contra elas. E como eles provam tudo isso? Ah, basta que eles os tenham sonhado.

Vemos então como Satanás se manteve no controle para endurecer os homens com tal atrevimento e ousadia, que eles estão prontos e dispostos a afirmar aquilo que nunca conheceram, como se tivessem um bom testemunho disso de Deus e de sua verdade. Mas quanto a nós, temos que aprender com este versículo de São Paulo a não nos ofendermos quando vemos homens avançarem desta forma e tirarem tal vantagem para deturpar Deus a todos. Nunca nos preocupemos com isso, não é novidade, não começou hoje, mas há muito tempo. O que devemos fazer então? Certifiquemo-nos de que somos modestos e humildes o suficiente para ouvir e ser lentos para falar. Mas quando somos ensinados por Deus, então deixemos a nossa boca aberta para fazer confissão da nossa fé. No entanto, certifiquemo-nos de que nenhuma palavra escapa da nossa boca, a menos que estejamos convencidos disso nos nossos corações. E como podemos ser convencidos? Não simplesmente pensando que é verdade, ou simplesmente porque ouvimos outros dizerem isso; em vez disso, deveríamos ter certeza de que o recebemos de Deus.

Isto é o que devemos fazer. E, além disso, seja o que for que os homens nos ensinem, consideremos isso vão até que seja provado pela palavra de Deus. Poderíamos pensar que é bom o suficiente acreditar que o que outros homens dizem ser a verdade, mas ao fazê-lo retiramos uma parte da autoridade de Deus e roubamos dele o que é dele por direito.

Portanto, São Paulo condena esta falsa humildade no versículo que mencionei (Colossenses 1:18). No entanto, os católicos perguntarão se é certo que os homens presumam ir contra os dogmas da nossa mãe, a santa Igreja. Eles têm seus conselhos, onde se reúnem uma espécie de burros cabeça-dura, que não conseguem falar nem uma língua e nunca em toda a vida leram três folhas da Sagrada Escritura. E, no entanto, podem pronunciar conclusões sobre assuntos sobre os quais nem sequer pensaram.

Os católicos de hoje dão muita importância a isso. Senhor, como eles nos condenam por sermos presunçosos porque não faremos assim e depositaremos nossa fé neles, dando-lhes crédito por isso. Em vez disso, reservaremos isso a Deus, para que lhe seja dada a obediência que ele merece. Então, como os católicos nos condenam por orgulho por causa disso, deixe-nos saber que a sua humildade é diabólica, uma vez que afirmam obedecer a Deus, mas claramente se revoltam e se afastam de nosso Senhor Jesus Cristo. Pois é ele quem deve ter plena autoridade sobre nós, e não os homens, como já foi declarado. E é isso que devemos aprender com esta passagem. São Paulo acrescenta então que a lei é boa se o homem a usa legalmente. E isso está de acordo com o que falamos esta manhã. Ele estava falando sobre aqueles que eram metade judeus e metade cristãos; eles querem ganhar popularidade, obter favores e uma boa reputação, por isso tingem sua doutrina com a cor da lei. São Paulo foi instruído na lei desde a infância, como sabemos, e era bem praticado nela; mas ele viu bem que esses companheiros haviam violado a lei de Deus. Eles nunca se deram ao trabalho de buscar a doutrina da salvação na lei ou uma regra pela qual viver bem e santo, mas apenas especulações vãs e inúteis. São Paulo poderia facilmente ter sido tão sutil quanto o melhor deles, se quisesse: mas isso seria transformar um demônio em dois demônios. Não devemos entrar em tais disputas, para saber quem será o mais forte e quem vencerá a disputa. Pois se a Palavra de Deus fosse assim atraída, por assim dizer, pelos cabelos, tudo ficaria terrivelmente desordenado e daria em nada. Assim, São Paulo, vendo que esses homens fizeram do nome e do título da lei um escudo, não faria o mesmo; mas criou uma barreira contra eles, mostrando-lhes que ele não era inimigo da lei. E depois acrescentou que estava muito longe de abolir a lei dada por Moisés, mas antes a confirmou pela sua doutrina. Pois tudo o que ele pregou está totalmente de acordo com a lei e concorda completamente com ela. E a soma do que diz São Paulo é esta. Mas para que possamos compreender melhor o processo das suas palavras, ele diz antes de tudo, que a lei é boa, se um homem a usa legalmente. Essas palavras lei e legitimamente têm alguma semelhança entre si. É como se ele dissesse que a regra é boa, se continuar bem governada. Mas se um homem indisciplinado pronuncia esta palavra, governo, é apenas uma zombaria. E por isso São Paulo diz que os homens devem observar qual é o uso da lei; pois não raciocinamos nem discutimos se devemos guardar a lei de Deus ou não. Este deveria ser um caso resolvido para nós. Então o que? Resta saber qual é o uso natural da lei. São Paulo diz que a lei não é dada aos justos. Por que eles não o usam como pretendido? Pois a lei é, por assim dizer, um freio para conter nossos desejos e

concupiscências perversos. Veja como os homens são, por assim dizer, feras selvagens, e corra diretamente para onde suas concupiscências os levam. Um condena Deus e o outro é completamente pagão, sem qualquer compreensão e conhecimento do que é a verdadeira religião. Outro é dissoluto e fora de contexto durante toda a vida; outro é ladrão; outro é um traficante de prostitutas. E, diz São Paulo, se existem faltas piores, como a homossexualidade e outras infecções vis, é aí que a lei de Deus deve ser aplicada e posta em uso. Aqueles que estão fora do governo desta forma, sendo incendiados com afeições perversas pelo diabo, devem usar a lei de Deus para refreá-los, retê-los e detê-los, para que as vilanias do diabo não mais dominem eles.

Agora parece que esses homens a quem São Paulo falou estavam manchados por muitos pecados e eram homens muito maus, e ainda assim fingiam ser religiosos. E, hoje em dia, é difícil encontrar homens mais vilões, que sejam bestas mais horríveis, do que os monges e estudiosos católicos que servem como suportes do Anticristo Romano – para ser breve, todos aqueles patifes que mantêm o catolicismo. Quando eles sobem aos púlpitos para falar com animais selvagens (pois mantêm seus ouvintes em tal ignorância que não conseguem discernir o branco do preto), eles fazem seus prefácios especiais, e como? “Esses luteranos baniriam toda a honestidade do mundo. Não se fala mais em disciplina entre eles. Eles nos faziam comer carne às sextas-feiras. Não há nada entre eles senão frouxidão carnal; tudo está fora de ordem entre eles. Eles querem que todos os homens se casem e não terão mais esse estado de perfeição angelical entre nós. Eles não buscam nada além do prazer da sua carne e, portanto, não têm qualquer tipo de vida espiritual. E novamente, quando falamos em ser justificados pela livre misericórdia de Deus, o que acontecerá com as boas obras e méritos?”

Portanto, sempre que alguém ouve um desses homens falar, pensaria que não havia santidade senão neles, e que eles carregam isso em si. No entanto, é bem sabido que quando terminam de pregar sobre a castidade no púlpito, eles mantêm uma amante em seus aposentos e em cada cidade. E se eles têm livre acesso a qualquer casa, é para fazer com que cheire à infecção deles. E estes são os santos e zelosos companheiros do catolicismo. E se o mais santo deles for examinado, um homem encontrará alguns deles condenados por perjúrio (estou falando daqueles que são conhecidos e dos quais todo o mundo fala), outros por falsidade, por roubo. Outros não hesitam em entregar-se completamente à prostituição e a toda vilania. Outros são levados por concupiscências tão vergonhosas que se tornam homossexuais, o que é comum entre eles. E assim vemos como São Paulo lidou com os monstros que existem hoje em dia no catolicismo, e como todos os defensores do Papa são todos esses cães que latem contra a verdade de Deus para manter a sua tirania infernal. E por isso ele diz: “Vai, eis que estou aqui: o Evangelho é contrário à lei de Deus?” Eu digo não: para que prega o evangelho? Ensino que devemos ser reformados à imagem de Deus, que o homem deve renunciar a si mesmo, que deve deixar de lado todas as suas afeições, se quiser andar como lhe convém. E no que diz respeito ao nosso apetite perverso e ao mundo, que somos como homens mortos e, acima de tudo, que não sejamos sábios em nossos próprios conceitos, para fazer o que nos parece bom, mas aprendamos a nos entregar totalmente a Deus. Eis, diz Paulo, o resumo da minha pregação a respeito da vida dos homens.

Agora, o que dirão aqueles que defendem tão firmemente a lei? Se eles querem dizer que a lei deve ser bem observada, por que não começam eles próprios a fazê-lo? Em vez disso, procuram brinquedos e ninharias e sonham com coisas imaginárias, como saber quantos filhos um certo homem teve após sua morte e como está a raça e os descendentes de tal e tal homem. Eles se atormentam com muitas coisas que não servem para nada. Então, a lei de Deus não é usada profanamente com esse uso? Portanto, quem não recebe uma boa instrução da lei, não se importa nem um pouco com ela. E, portanto, é a eles que a lei de Deus precisa ser aplicada. Vocês, adúlteros, vocês, prostitutos, vocês que vivem livremente, vocês, criaturas bestiais e vilãs, vocês, rebeldes, vocês que veem a Deus com desprezo, vocês não podem usar a lei para superar seus próprios vícios, mas vocês obrigarão os homens a observar cerimônias de não sei o que. E a lei, entretanto, é simplesmente deixada de lado, como se tivesse sido dada sem motivo, enquanto os homens perturbam as suas mentes com ninharias e coisas sem valor. E assim vemos o significado de São Paulo.

Agora, para fazer com que esta parte das Escrituras sirva para nosso benefício, observemos que quando os ímpios disfarçam a palavra de Deus, não devemos, portanto, ficar abatidos e desanimados, visto que há muitos que buscam nada além de uma chance de voltar atrás. afastar-se da verdade do Evangelho quando vêem algum problema. Eles dizem: “O que devo fazer? Vemos que há opiniões diversas, é melhor eu simplesmente desistir.” E assim, um pequeno canudo causará tal obstáculo que possivelmente não conseguiremos ultrapassá-lo. Resumindo, o mundo é tão frágil que preferiria procurar em toda parte uma oportunidade para a devassidão, se não tivesse qualquer razão para se afastar da obediência a Deus. Mas, por outro lado, São Paulo nos mostra aqui que, mesmo que todas as tentações do mundo fossem colocadas contra nós, e o diabo se esforçasse tanto a ponto de distorcer a Sagrada Escritura de um modo ou de outro, a fim de confirmar erros, perversidades e propósitos amaldiçoados – até ao ponto em que as palavras de Deus possam parecer confusamente concordar – mesmo que o diabo pudesse fazer com que as Escrituras parecessem desculpar certos erros e enganos perversos, ainda assim não devemos ser convencidos por tudo isso. A lei de Deus não foi profanada no tempo de São Paulo por aqueles que a aplicavam desta forma às coisas inúteis? Então Paulo diz que seria melhor que a lei fosse completamente expulsa do nosso meio do que abusada dela e depois jogada aos nossos pés? Não, não. São Paulo não diz isso. Ele sabia que Deus não deu a lei para que ela pudesse ser pisoteada. A lei é boa como é, diz ele, mas os homens ainda devem usá-la bem. Portanto, de acordo com esta regra, glorifiquemos sempre a Deus na sua palavra quando vemos que há homens ímpios e de má disposição que profanam a Sagrada Escritura, estragando-a e rasgando-a em pedaços. Não nos deixemos levar por nenhum obstáculo colocado em nosso caminho, para falar mal contra a palavra de Deus. Em vez disso, mantenhamos sempre que é bom e santo. Na verdade, podemos facilmente encontrar obstáculos na vida dos homens que possam nos fazer odiar a lei de Deus. E por que isso? Se o uso da lei for tal como diz São Paulo, ou seja, que devemos ser considerados em nossa natureza, como ela é, e se a lei de Deus vier, a que propósito ela servirá? Servirá para nos condenar. É por isso que São Paulo a chama de mensagem de morte, que serve para nos enviar maldição e destruição. E visto que a lei de Deus condena a todos nós e não nos deixa nenhuma esperança de salvação em si (digo em si porque serve para governar nossas vidas; São Paulo não fala aí das promessas), se a lei é tal, não temos nós ocasião para odiá-lo, especialmente se o fizermos sem pensar? Apesar da falha e da maldade que existe em nós, temos que conhecer o que é bom e santo. São Paulo também diz no capítulo sétimo aos Romanos, depois de dizer que a lei nada traz aos homens senão a condenação até que tenham fé em Jesus Cristo. Ele diz que é boa, santa e proveitosa, pois o mal vem de nós e não da lei. Portanto, quando vemos que os homens são tão perversos, que distorcem a verdade e o sentido natural das Sagradas Escrituras para concordar com as suas invenções, a autoridade de Deus, ou da sua palavra, não deve ser diminuída. E é isso que devemos lembrar em primeiro lugar. Mas lembremo-nos também de que todos aqueles que aproveitam a Sagrada Escritura para serem desviados e levados são dignos de uma dupla condenação. Na verdade, diante dos homens eles podem parecer ter algum buraco inicial, mas não servirá de nada diante de Deus se eles disserem: “Eu estava planejando fazer o bem, pretendia buscar a verdade, mas tive um mau sucesso”.

Isto é o que muitos dirão quando forem levados e enganados. Mas já que mentem, porque Deus não permitirá que sejam enganados aqueles que se aproximam dele em busca de doutrina. E por que isso? A Sagrada Escritura não é apenas boa e santa em si mesma, mas é boa para nós, é proveitosa para a nossa salvação. Pois descobriremos ali que Deus é um mestre bom e correto para nós, de modo que também seremos bons estudiosos. Mas por que somos levados ao erro dessa maneira, se não é por causa dos nossos apetites perversos, ou melhor, do nosso orgulho? Alguns saberão mais do que precisam saber e serão precipitados e imprudentes em julgar antes de aprenderem o que deveriam. Outros estão sempre ocupados e não procuram nada além de introduzir alguma ninharia nova, e é por isso que muitos são enganados pela distorção das Escrituras. No entanto, se formos a Deus solicitando-lhe sinceramente e com toda humildade, ele será tão bom quanto sua palavra proferida nos Salmos. (Sal. 119) Em outras palavras, ele será professor para os humildes e para todos os pequeninos. Temos então algum motivo para temer que seremos enganados quando tivermos

Deus como nosso mestre?     Portanto, finalmente, devemos usar corretamente a Sagrada Escritura, ou seja, não distorcer a palavra de Deus para se adequar às nossas fantasias, mas prestar atenção com toda a pureza ao que está contido nela e orar para Deus nos declare sua vontade pelo seu Espírito Santo; sabendo que as Sagradas Escrituras não foram dadas pelos homens, nem cultivadas nos seus jardins. Da mesma forma, a exposição não pertence às criaturas, mas ao Espírito Santo, que nos declarará o que nelas está contido. Se continuarmos assim, tenhamos a certeza de que Deus nunca nos permitirá achar que a lei é diferente daquela que foi estabelecida por São Paulo, isto é, boa e que não contém nada que possa ser rejeitado, porque é lucrativa para nós. Enquanto isso, aprendamos a manter o controle de nossas afeições perversas, sabendo que Deus nos refrearia como animais selvagens. Na verdade, não temos tempo agora para cobrir isso completamente. No entanto, antes de terminarmos, devemos abordar este último ponto: para sermos bons estudiosos da lei, todos devemos lembrar que temos de ser refreados sob o serviço do nosso Deus. Para que possamos lucrar com a lei, devemos submeter todas as nossas concupiscências perversas e renunciar a todas as nossas afeições carnais. E esta é a maneira de aplicar a lei às nossas vidas, e se o fizermos, descobriremos que São Paulo está certo ao dizer que a lei foi dada para reprovar toda injustiça e iniqüidade. Saibamos então que somos culpados de mil maneiras diante da majestade de Deus e, portanto, humilhemo-nos diante dele, entregando-nos totalmente ao seu serviço, como devemos estar sujeitos a ele por toda a vida.

Agora prostremo-nos diante do nosso bom Deus, confessando as nossas faltas, pedindo-lhe que nos afecte de tal maneira que corramos directamente para ele, e que ele nos aceite pela sua bondade gratuita, nos perdoe de tudo. as ofensas que cometemos e que pelo resto de nossas vidas ele nos tornará semelhantes a ele. E porque estamos neste mundo, por assim dizer, de certa forma, podemos diariamente chegar cada vez mais perto da meta que nos é proposta, até chegarmos àquela vida celestial que somos ordenados a buscar e trabalhar para entrar. E que ele não seja apenas favorável a nós, mas a todas as pessoas e nações da terra, etc.

Compartilhe esse conteúdo!